Wladimir Volegov, “Near lake”, 92x73 cm, oil on canvas. December 2017 |
Lembra-te que as coisas mais belas do mundo são também as mais inúteis.
John Ruskin, As pedras de Veneza, I
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Uma das
coisas mais intrigantes de nossa sociedade é o fato de que: poetas, filósofos,
pintores, e tantos outros representantes das artes e ciências ocupem certo
lugar de destaque em uma sociedade que os ignora totalmente. Evidentemente, o
leitor encontrará uma grave contradição no que afirmo: se possuem lugar de
proeminência, como podem ser ignorados? Os eruditos, sempre em número escasso,
sabem da importância de Shakespeare, Dante, Goethe, Einstein, Newton, etc. Mas,
o homem comum, parcela superior numérica da sociedade, pouco caso faz de suas
existências. Encontrar quem leu os clássicos filosóficos e literários é tão difícil
quanto encontrar agulha num palheiro. O homem comum, em sua vida ordinária,
pouco importa-se com quem ganhou o prêmio Nobel de literatura no ano corrente;
quem foi Shakespeare; o que foi a revolução de Duschamps na arte. Para ele, essas
questões dificilmente tomam espaço em suas discussões de final de semana com os
amigos. Ao menos no Brasil é assim. O resultado do campeonato de futebol; o
capítulo da telenovela, o resultado da mega-sena, lhe interessam muito mais do
que todo esse vozerio literário e artístico. É provável até que, em sua vida
cotidiana, você não conheça uma única pessoa que conheça as obras de
Shakespeare; que saiba discutir as questões aristotélicas e platônicas; que
conheça com profundidade pontos fundamentais da história universal; que esteja
atento aos reais problemas políticos; que apreciem a boa arte clássica; a
música erudita; que se vista e porte-se com elegância... No geral, irás
encontrar pessoas ordinárias, cuja maior preocupação é sobreviver, e nessa lida,
ignoram tudo o que a alta cultura produziu. O maior desafio, dizem alguns, é
provar a estas pessoas que arte e cultura possuam alguma importância em suas
vidas. Mas a grande verdade é que, alta cultura não foi feita para o deleite de
todos. Tão pouco será fácil provar que elas possuam alguma utilidade
extraordinária.
A grande verdade é que a alta cultura é um arcabouço de
coisas inúteis... Elas não satisfazem nenhuma necessidade imediata e inadiável do homem; ela
não sacia a fome e a sede de ninguém; não cura enfermos; não abriga famílias... Pergunte-se, o que uma família carente de tudo faria com um
concerto de Bach ou com a obra completa de Shakespeare? É bem provável que ele
espere o concerto acabar para pedir os pratos da percursão para usar na cozinha
e os livros de Shakespeare para acender sua lareira. Reconhecendo a completa
inutilidade da literatura; da música, da pintura para a existência do homem, reconhecemos,
porém, o seu valor incalculável e a sua necessidade intima para o homem... E o
mais extraordinário: que embora inúteis, nenhuma sociedade viveu sem elas. Há
coisas inúteis sem as quais nenhum homem parece viver sem. E isso é o mais estarrecedor.
Nem tudo que é inútil é sem valor... Há coisas sem qualquer utilidade cujo
valor excede o que mais útil o homem comum julga; e há coisas de grande
utilidade sem valor. Valor e utilidade nem sempre são complementares. E é
exatamente esse interesse por certas coisas que não são de todo uteis que nos
coloca acima dos animais: imagine, pois, que os únicos interesses dos homens
sejam: dormir, comer, beber transar e ter filhos. Que vida mais sombria teríamos?
Retire todo o aparato artístico, filosófico e literário de nossa sociedade e
deixe apenas as necessidades biológicas e vereis o caos em seus extremos.
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